quinta-feira, 28 de julho de 2016

O Fim


Poeta Romildes de Meirelles

(01-01-1924, Salvador - †11-09-2016, Rio de Janeiro)

Não sei por quê, mas hoje estou tão triste
que até parece que estou sozinho
no mundo, sem amor e sem carinho
e, no meu peito, a solidão persiste

em se abrigar. Meu coração resiste...
procuro embriagar-me com o vinho
do amor, mas só há dor em meu caminho.
Sem esperança, em mim somente existe

a certeza do fim, pois sei que em breve
há de chegar o dia em que me leve
a parca terminando o meu tormento.

E os versos tristes que eu aqui compus
acenderão uma modesta luz
na etérea imensidão do firmamento.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)


No Jazigo do Poeta






           Ao Saudoso Poeta FRANCISCO IGREJA

- Vem coveiro, mostrar por piedade
onde descansa meu querido amigo;
quero prestar ao pé de seu jazigo
o meu último preito de amizade.

Eu quero ver seu derradeiro abrigo
e matar em meu peito esta saudade;
se foi a morte uma fatalidade,
foi para nós, poetas, um castigo.

- Eis, senhor, nesta cova escura e fria
jaz o poeta e toda sua poesia.
- Aqui?! Aqui?! Oh, não, mentes, coveiro!

Não nesta cova pequenina, abjeta,
pois pra conter os versos do poeta
até mesmo é pequeno o mundo inteiro!


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)


Ser Poeta




Ser Poeta é querer pegar a lua
quando flutua pálida no céu.
Catar estrelas pelo firmamento
cantando ao vento um triste verso seu.

Fazer do seu sofrer uma alegria,
fazer poesia até da própria dor;
fazer da vida eterna primavera,
uma quimera, um sonho, eterno amor.

Ser Poeta é sonhar mesmo acordado,
sem ter cuidado com seu pensamento
que segue livre em voo tão suave
tal como a ave de asa solta ao vento.

Ah!... Ser Poeta!... É quase ser um Deus!
Os versos seus constroem um Universo
em sua mente. Em noite enluarada
exalta a amada em seu mais lindo verso.

Ah, ser poeta é ver numa criança
luz de esperança de um viver melhor.
Ver alegria onde encontrar tristeza
e ver beleza em tudo ao seu redor.

É fazer luta contra a iniquidade,
contra a maldade a dor e a injustiça,
é ser um paladino denodado,
se derrotado, não deixar a liça.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Poema do livro ENTARDECER)



Ocaso

















Por mais que a vida o maltrate
não guarde, amigo, ressábios.
Um guerreiro não se abate,
cai com um riso nos lábios.


Procura sempre ter digna postura,         
guardando dentro em ti o teu segredo,
os teus traumas, tuas mágoas e o teu medo
pra que não vejam tua desventura.

Tira da face a marca da amargura

e em lugar dela põe um riso ledo.
A vida é curta e acaba muito cedo,
e em breve enfrentarás a sepultura.

Nem mesmo escutes o que estou dizendo,
não creias no que falam, sê descrente,
pois sendo o mundo assim, mesmo sabendo

que és um ser descartável e minúsculo,

não mostres a este mundo indiferente
o iminente chegar de teu crepúsculo!



Autoria: Romildes de Meirelles
(Trova e soneto do livro ENTARDECER)



Tão Só




Estou chegando ao fim desta triste jornada
e encontrando-me só, sem ter mais ambições,
vejo postas por terra as minhas ilusões
e tudo o mais que amei nesta árdua caminhada.

Os amores que eu tive, as ardentes paixões,
os meus sonhos de amor, as amantes e cada
prazer, tudo acabado ao final desta estrada.
É triste ver, por fim, nossas desilusões.

Eu vivo abandonado, acabrunhado e só,
tão desprezado, velho e pobre como Jó,
vivendo qual um barco a navegar a esmo.

Mas, apesar de tudo, eu trilho o meu caminho
carregando essa cruz!... e sigo tão sozinho,
tão só, que sinto até a ausência de mim mesmo!..



Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)





Fim de Estrada

Pintura de GRAHAM GERCKEN



Nessa comprida estrada da existência,
que venho palmilhando em dura lida,
já levei muitas lutas de vencida,
também derrotas tive com frequência.

Hoje me pesa toda a experiência
amealhada ao longo desta vida.
Se já amarguei o fel da decaída,
aspirei das vitórias muita essência.

Porém agora já no fim da estrada,
toda a porta em que bato está fechada
e torna- se mais áspero o terreno.

E assim na vida tudo hoje me assombra,
até na árvore, se eu busco a sombra,
"a sombra é triste e o fruto tem veneno".


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Fim de Tarde


Pintura de KEN HONG LEUNG


Num fio de luz o sol se prende no horizonte
e preguiçosamente imerge no profundo
e misterioso mar. Cai a paz sobre o mundo
na languidez da tarde!... As águas, sob a ponte,

murmuram uma prece... a noite chega... o monte
silhuetado ao céu é um gigante rotundo
entre as flores do vale e vê-se mais ao fundo,
entre pedras e areia, a placidez da fonte!

Tudo é silêncio e paz... Na capela da aldeia
a voz do sino eleva um canto para Deus,
doce canto de amor, um hino de saudade!

Da noite, pelo véu, brilhante a lua cheia
revive no meu peito antigos sonhos meus
numa tristeza atroz que a minha mente invade.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)

Amo o Belo


Pintura surrealista de JIM WARREN


Amo o belo!... Amo o céu, o mar, a flor,
amo o lago e a montanha. Amo a beleza
das matas, amo o pássaro cantor,
amo o rio, a cascata e a correnteza,

Como poeta adoro a natureza.
Amo a noite estrelada, amo o fulgor
do sol, adoro o céu azul turquesa
e o oceano bravio, destruidor.

Mas quando vejo o mar enfurecido
bater contra o rochedo carcomido,
quebrando rochas destruindo abrolhos,

então amo este mar, este oceano,
onde quero morrer - desejo insano -,
as águas verdes dos teus verdes olhos...


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Feliz Aniversário






Reparem como está mais belo o dia!
Vejam o colorido destas flores
e o eflúvio mavioso dos odores;
a beleza das aves e a harmonia

dos seus trinados... Vejam a alegria
Que há na terra, no mar... vejam as cores
das nuvens pelo céu... e os beija-flores
distribuindo beijos. Gostaria

de saber o porquê de um dia assim,
que o mundo inteiro se enfeitou, enfim,
cobrindo-nos com plácido dossel.

O segredo é que Deus quis enfeitar
a Natureza só para ensejar
FELIZ ANIVERSÁRIO PRA BEBEL!


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Mudez








“ Sou voz perdida na mudez do mundo”
               Verso de Sérgio Bernardo


Vejo a miséria, que nos fere fundo,
vencer o pobre que contra ele luta.
Por isso eu grito, mas ninguém me escuta,
sou voz perdida na mudez do mundo!

Vejo um menino num casebre imundo
chorar pela pobreza que lhe enluta!
Pode chorar, gritar, ninguém lhe escuta,
é voz perdida na mudez do mundo.

Enquanto isso os nobres senadores,
deputados, edis. governadores,
põem o Brasil em sono assaz profundo,

mas usam contra os pobres força bruta...
por isso eu grito, oh Deus, ninguém me escuta,
"sou voz perdida na mudez do mundo."


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Angústia


Pintura de FRNANCISCO SANCHIS CORTES



Ontem, a solidão que me oprimia
é hoje a angústia que me esmaga o peito.
Eu sinto que minha mente se esvazia,
e tenho o coração quase desfeito.

Quero pensar. O pensamento fia
um tecido de ideias; contrafeito
vejo-o desmoronar, como magia.
Volto a pensar, revolvo-me no leito

e persigo uma ideia tenazmente,
mas nada permanece em minha mente,
e este vazio atroz me tira a calma.

Quero escrever, porém a solidão
torna vazio o peito, o coração,
vazia a mente e mais vazia a alma.

Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Eugênia Sampaio






E u quis fazer-te, Eugênia, uma poesia,
U ma poesia linda, primorosa,
G uiado por tua forma graciosa
E a inspiração de minha fantasia.

N o teu sorriso cheio de alegria
I maginei a aurora radiosa
A nunciar na boca cor-de-rosa
S ingelas cores do raiar do dia.

A testa ampla, o corpo escultural,
M ãos liriais, voz clara e sensual,
P és de musmê e bela cabeleira.

A ltivo porte e o olhar meigo e feliz.
I sto é o acróstico, Eugênia, que eu fiz:
O retratar de nova companheira.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)


Lamentos


Escultura em bronze de CZOBOR SÁNDOR


Por que, meu Deus, por que tanta tristeza,
tanta dor, tanta angústia no meu peito?
Por que viver sofrendo desse jeito?
Por que devo manter ainda acesa

a chama desse amor? Tenho certeza
que nosso amor encontra-se desfeito!
Porém confesso, embora contrafeito,
que sinto ter minh'alma ainda presa

a teus encantos. Hoje já não sinto
mais alegria, tudo foi extinto;
vivo sozinho, imerso na incerteza,

na dúvida cruel, nesse abandono!...
Nas minhas noites tristes eu questiono:
“Por que, meu Deus, por que tanta tristeza!?


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Derrota



Eu não te quero mais disseste um dia
tomada de um acesso de loucura.
Foi este o início de uma atroz tortura
que em pesar transformou minha alegria.

Foi uma carta sem assinatura
o motivo de tua rebeldia.
Nossa existência até então corria
num ambiente de alegria pura;

Um carta sem nome... O remetente
ignóbil se ocultou covardemente
no anonimato pra fazer maldade.

Uma pequena carta... Poucas linhas
de mentiras vulgares e mesquinhas
foram mais forte que a felicidade!


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)



Lutarei


Pintura de Edward Alfred Cucuel


Veja , meu bem, a que está reduzido
aquele amor, aquele fogo imenso...
Olho pra trás tristonho e me convenço
que tudo foi um sonho colorido!

A nossa vida hoje é sem sentido:
e a cada dia mais, meu bem, eu penso
que aquele amor, outrora tão intenso,
está ficando aos poucos consumido!

Vivemos juntos, sim, mas que tristeza”...
Nossa paixão não está mais acesa,
em nossa alma resta apenas dor!...

Mas não desisto, amor, te quero tanto,
que dos meus olhos secarei o pranto,
“e sempre lutarei por nosso amor!...”


Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)


terça-feira, 26 de julho de 2016

Canção da Brisa


Pintura de ANDREI BELICHENKO




Mote: “ A brisa canta uma canção pequena”
                        Tereza Regina Cavalcante

Quando desnuda, vai minha morena
banhar-se à tarde na beira do rio,
com o belo corpo trêmulo de frio,
“a brisa canta uma canção pequena”.

Se a tarde é morna, entoa u’a cantilena
que se semelha da rolinha o pio,
julgando ser alegre desafio,
“a brisa canta uma canção pequena”.

Quando de volta à casa pequenina,
que fica lá no alto da colina,
trazendo no cabelo uma açucena,

se veste em festa toda a natureza,
fazendo homenagem à sua beleza,
“a brisa canta uma canção pequena”.



Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)




domingo, 24 de julho de 2016

Minha Santa


Pintura de NADEZHDA STRELKINA


Para HELENA

Há muito eu descobri, querida, o que é ternura,
o que é dedicação, o que é cuidado e amor.
Pois em ti encontrei, quando imerso na dor,
a presença a meu lado, imaculada e pura

de uma esposa fiel, tratando com doçura,
do mal que havia em mim. Jamais tanto vigor
vi em frágil mulher. E é maior seu valor
porque muito depressa adveio minha cura.

Mas agora eu confesso, estando já curado
querer uma outra vez ficar adoentado
tendo sempre, porém, comigo bem juntinho

esta frágil mulher, esta sublime santa
para cuidar de mim com suavidade tanta
que me inunde de amor de ternura e carinho.

Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)