quinta-feira, 14 de julho de 2016

O Relógio






Ei-lo impávido e sereno!...
Ele é o coração do tempo.
Nada altera o seu pulsar:
Nem dores, nem alegrias,
Nem bonança ou tempestade,
A lida do dia-a-dia,
Tristeza ou felicidade,
Nada altera o seu pulsar!...

Por ele os segundos passam
Passam os minutos, as horas,
Os dias, os meses, os anos
E mil séculos sem fim.
Sua forma lembra o infinito!...
E ali, frio, preso à parede
Deixa o tempo se escoar
Lenta e inexoravelmente...
... e na quietude sombria
de silente madrugada,
seu tique-taque monótono
são gotas frias de som
pingando... pingando sempre
em um poço de silêncio.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Poema do livro ENTARDECER)



Sentimentos das Flores

Pintura de Eduarda Lapa



Eu descobri nas flores sentimentos.
Sentem saudade, amor, melancolia,
tristeza, orgulho, paz e alegria
e sofrem, porém sofrem sem lamentos...

Elas fenecem envoltas em tormentos,
por saudade, tristeza ou nostalgia;
mas se sentem prazer, em louçania
transformam todos os seus sentimentos!...

Lembras do dia em que te dei uma rosa?!
Quando a pegaste, ficou mais formosa
ao sentir de suas mãos a suavidade;

mas a saudade que tu me doaste,
ao perceber, tristonha, que a deixaste,
está morrendo, aos poucos, de saudade!...

Autoria: Romildes de Meirelles
(Soneto do livro ENTARDECER)




Cego





















Como é triste o fim da tarde!...
ouvir repicar o sino
envolve a alma em um ar de
amor místico e divino.



Não queira conhecer o sofrimento
daquele que não vê. É uma tortura
imaginar a cor na mente escura
que vê o mundo apenas pardacento.

Não poder enxergar, do firmamento,
o passeio do sol, na curvatura,
nem o brilho da estrela que fulgura
ou a beleza do sol no nascimento.

Já que não posso ver com precisão,
pois vou ficando aos poucos sem visão,
eu fico ouvindo o murmurar das cores

e na triste renúncia desta vida,
escuto na minha alma dolorida
o silencioso renascer das flores.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Trova e soneto do livro ENTARDECER)


A Uma Oftalmologista


Instituto Benjamin Constant (Rio de Janeiro)


















Se sofre quem nasce cego
e que não verá jamais,
sofre muito mais, não nego,
Quem já viu e não vê mais!...



Sentindo o horror de ficar cego um dia,
já que a cegueira avança lentamente,
busquei curar-me imediatamente
pra ficar livre, enfim, desta agonia.

No Benjamim achei o que eu queria
trazendo-me esperanças novamente.
Uma jovem doutora competente
fez até renascer minha alegria.

Com palavras de fé, como uma prece,
trata de todos a gentil Valeska
com mãos macias, leves, vaporosas.

Minorando o pesar de quem padece
ela mostra sua alma leve e fresca
como as almas dos lírios e das rosas.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Trova e soneto do livro ENTARDECER)


Cair da Tarde




















Uma serenata ecoa
por entre os becos distantes
e a luz da lua abençoa
o ingênuo casal de amantes


Tangendo doce e lentamente, o sino
tece a oração do Ângelus na tarde
morna, qual suave e delicado hino
ao sol, que no horizonte ainda arde.

Vem logo a escuridão. Um cristalino
canto de pássaro nos trás um ar de
melancolia, paz e amor divino.
A noite chega, sem fazer alarde,

com negro manto pra encobrir o dia.
Logo após vem a lua que alumia
com sua luz os pontos mais distantes.

derramando seu brilho cor de prata,
como milagre que o céu desata,
abençoando a alma ingênua dos amantes.


Autoria: Romildes de Meirelles
(Trova e soneto do livro ENTARDECER)



Completamente Só


















A saudade é dor matreira
que me segue noite e dia,
pois saudade é companheira
de quem não tem companhia



Estou completamente só. O dia
acaba... a tarde morre docemente
e eu estou só em meio a tanta gente
nesta tarde chuvosa, cinza e fria.

A solidão da tarde me angustia,
deixa-me imerso em um torpor dolente,
vendo o tempo esvair-se lentamente
de gota em gota em triste nostalgia.

A chuva aumenta minha ansiedade
enchendo-me de mística saudade
numa tristeza que o olhar me embaça

e vejo tudo qual se fosse um sonho
onde o tempo se escoa tão tristonho
na cadência da chuva na vidraça.



Autoria: Romildes de Meirelles
(Trova e soneto do livro ENTARDECER)